Conversamos com Fernando Chavëz, novo responsável pelos artworks da Not Another

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Por em 4 de maio, 2021 - 04/05/2021

Mais do que eternizar arte na pele das pessoas, o tatuador e ilustrador Fernando Chavëz também é responsável por garantir belíssimos trabalhos visuais para alguns artistas e gravadoras de música eletrônica. Uma de suas entregas mais recentes foi a capa do EP Sand, do argentino Andy Arias, lançado pela gravadora Not Another, que desde sua idealização, em 2016, mantém uma enorme preocupação estética em seus lançamentos — antes os artworks eram assinados por Davi Leventhal.

Nesta nova “fase visual” do selo, aproveitamos a oportunidade para trocar uma ideia e conhecer mais o trabalho de Fernando Chavez (Death Mantra Aka Imarginal), que nos conta como entrou no universo da arte, sua conexão com a Not Another e a música eletrônica, além de outros trabalhos já realizados dentro da música:

Fernando, beleza? Conta um pouco quando você começou a se envolver com arte e em que momento isso passou a ser algo profissional?

Passei a vivenciar arte, em um coletivo extinto há mais de 10 anos, a BASE, tive contato com várias referências de fotografia, graffiti, pixação, e com 15 anos ganhei meu primeiro sketchbook e nankin, que foi o material que comecei a estudar durante um longo período. Logo depois cursei design, que foi uma base técnica pras ideias que eu tinha, e optei por trabalhar com desenho, em seguida meus amigos me influenciaram a tatuar.

O que mais te atraiu e encantou pra entrar nesse universo? Tem algum artista que você carrega como uma grande referência para seus trabalhos? 

Eu vim de uma família extremamente religiosa e tive zero contato com arte a vida inteira, e o que me fez começar a me interessar foi a quantidade de plataformas que poderia trabalhar. Já trabalhei de call center, designer de plano de saúde, já fui professor de reforço no lixão de Aguazinha, e depois de todos esses empregos, percebi que nem que demorasse muitos e muitos anos como demorou pra eu começar a me sustentar de arte, eu ia perseverar, porque preferia criar a minha visão imagética do mundo e viver dessa ideia.

Foi um vasto período de transição, a primeira vez que paguei meu aluguel com arte foi com 21 anos, e depois disso fui expulso de casa por ter tatuado meu braço heheh depois disso foi: faça arte ou morra. Quando me faziam essa pergunta antigamente, eu falava o nome de um muralista e de um desenhista de concept que eu gosto muito, mas com o passar dos anos parei pra pensar que a minha maior influência é no pensamento, o artista que mais inquieta minha visão, e é foco do meu estudo desde o começo, é o guitarrista da banda The Mars Volta, Omar Rodriguez, mais de 50 cds solo, de vários e várias vertentes, progressivo, salsa, punk, post hard-core, eletrônico noise, a influência mental que tenho dele é enorme, pela visão de produzir infinitamente e mesclar e samplear o próprio trabalho no passar dos anos, e ainda continuar sendo relevante ele da sua maneira.

Sobre a relação com a Not Another: como rolou o contato entre vocês e o que te fez tomar  a decisão de aceitar esse trabalho de ilustração das capas dos EPs?

Tatuei George (que é um dos heads do coletivo) em São Paulo e tivemos uma troca de ideias massa, ele me mostrou o trampo do coletivo, e tem tudo haver com a visão que tenho tentado estar sensível, futurismo em HELLCIFE, então esse foi um grande indicativo pra eu participar da proposta.

Existe algum estilo “predominante” no seu desenho? Como você o caracterizaria? 

Já tive várias fases no meu trabalho, faz 15 anos desde que comecei a produzir. Então nesse período eu já mudei pelo menos 40 vezes, rs. Considero que de 3 e 3 meses tenho uma ideia nova pra me dedicar e não me prendo a um estilo, nem a um material, eu gosto de fazer pixo no ônibus em uma estética mais simples e mais rápida, e também gosto de fazer trabalhos mais complexos que podem demorar até seis meses na mesma tela. Não tenho predominância de um estilo, tenho como predominante a experimentação e o estudo da psicologia da imagem, isso me aproxima das pessoas que consomem meu trabalho.

Como você inicia seu processo criativo na hora de desenhar uma capa?

Uma capa que fiz recentemente, de Grime, um EP que inclusive foi lançado ontem em todas as plataformas da internet de som, KILLAHMANJARO, eu tentei entender a atmosfera sonora e na minha mente se passava aqueles filmes de Kung Fu, que Bruce Lee dava porrada em mais de 100 pessoas, ou quando Neo de Matrix parava as balas. Lembrando dessas cenas, tentei compor algo FUTURISTA-ORIENTAL, que acho que encaixa totalmente com a proposta, mas meu processo criativo atualmente tem sido fazer vários desenhos e fazer uma colagem dadaísta lombrosa, colocar tipografias, usar cinza e cores fortes em contraste, mas isso pode mudar mês que vem…

E você curte música eletrônica em geral? Acompanha mais de perto projeto/produtor em especial?

Gosto muito! O produtor que acompanho mais é Diniboy, do Brasil Grime Show, ele é influência pra toda essa geração ‘Era Covid’, um toque de experimentalismo, 140bpm lisérgica noize, mas tudo muito organizado e fazendo colaboração com MCs do mundo todo. O Grime já existia na Inglaterra, mas ele e outros produtores trouxeram outra ideia misturando com uma sonoridade brasileira forte.

Além da Not Another, você já havia feito algum trabalho similar anteriormente, relacionado à música?

Posso citar alguns: Fiz pra Terrazas saxofonista do The Mars Volta, a capa de um Vinyl (TERRAZAS), O Medulla dos geniais Keops e Raony (capa do Ep Homem Bom) uma capa que gosto muito da Kallouv, do cd Pluvero banda foda de instrumental Recifense, meu primeiro trampo abstrato como capa. Já participei com meu comparsa Raone Ferreira de um clipe da banda calle 13 fazendo um desenho colaborativo, uma tela a3 que passamos uns dias produzindo pras imagens. E na pandemia fiz 4 artes pra banda cordel do fogo encatado, que foi muito foda pra mim produzir, sempre tive muita influência da psicodelia da banda nas minhas ideias.

O que você faz para se manter constantemente inspirado? Esse é o desafio para você?

Com certeza é um desafio. Estar inspirado é estar bem mentalmente e fisicamente, então prioritariamente cuido de andar pela cidade e tirar uma média de 80 fotos que eu posto no meu instagram @deathmantrah sempre dou um rolê de bike pelas partes apocalípticas da cidade, onde parece que o mundo já acabou. Isso nutre minha alma. Todo dia passo mais de 2h vendo sites de referências pra postar no nosso projeto de curadoria @lowtechtonism e como faço essa curadoria com meu selecionado João Barata, a gente tá sempre trocando ideia de referências pra postar. Tenho terminado estudando dessa maneira, referências clássicas sci-fi, futuristas, distópicas, e o que eu vejo em Hellcife influência completamente e nutre meu trabalho.

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Uma publicação compartilhada por Fërnandö Möräëz 混沌 (@deathmantrah)

No geral, qual é a mensagem que você busca transmitir com o seu trabalho? Obrigado e um abraço!

“Eu sou desse mundo, mas não necessariamente preciso estar aqui, gostaria de ir pra longe daqui, nem que fosse com a minha mente, me conectar com meus ancestrais, que pintavam as paredes enquanto se aqueciam celebrando sua própria versão do mundo, seja ela ancestral primitiva – ou futurista. Uma fuga para a existência que às vezes é brutal, e ironizar, transgredir, e degenerar a arte, sem mestres, sem deuses, sem hierarquia.”

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