Hernan Cattaneo estreia no novo templo em uma noite para os livros

Tags: , ,
Por em 8 de outubro, 2024 - 08/10/2024

Fotos por Maira Dill

Se algum dia, um livro sobre a extensa e mágica história do Warung Beach Club for escrito, certamente a noite do último dia 20 de setembro estará nele. O zumbido do que vivemos nesta sexta-feira de tempo nublado e chuviscos continua a ecoar pelos dias e dias que se seguem. Todos querem voltar no tempo e reviver um pouco das quase 9 horas de set de Hernan Cattaneo no templo de música eletrônica. Na verdade, foi mais uma noite daquelas que seria adicionada a uma relação Club & DJ que mereceria um capítulo inteiro à parte. 

Quando a sua data anual foi anunciada já em setembro, causou surpresa, de maneira positiva claro, afinal, um all night long de el maestro no novo templo era algo que já se desenhava com muita expectativa,  antecipar isso, então, foi uma  uma explosão. Todos os camarotes vendidos com semanas de antecedência e os ingressos só não deram sold out, porque a curadoria resolveu abrir também o Garden para receber a estreia de um dos principais produtores de progressive house dos últimos anos,  o colombiano Kamilo Sanclemente, junto de Leozinho & Thibes e 5OFUS. 

20 de setembro, um dos dias mais esperados do ano, vou a um jantar clássico entre brasileiros e argentinos na praia brava. Cada um deles tinha várias histórias para contar sobre o personagem da noite. Às 21h vamos para o Warung (que já estava aberto para o público) esperar a chegada de Hernán. Seu voo estava previsto para aterrissar às 19h em Florianópolis, então, o tempo era algo escasso. 

No Warung, a todo momento encontro amigos de longa data, muitos fãs da geração 2010 que não vinham a anos se fizeram presentes, um prelúdio de toda expectativa criada semanas antes, ninguém quis correr o risco de ficar de fora. 

22h, nada dele aparecer, a tensão na pista era evidente. Seu voo demorou um pouco, e isso já foi suficiente para atrasar em 20 minutos sua chegada, algo que ele realmente não gosta. Além do som progressivo dos ingleses (bandas e DJs) que Hernan absorveu e melhorou, a pontualidade é algo que ele preza muito. Ao chegar, vai direto para palco e rapidamente espeta seus pen-drives, colocando magistralmente um som ambiente. O motivo? O secretário de turismo e eventos de Itajaí, Thiago Morastoni, aguardava uma homenagem por parte da prefeitura. Quando Thiago começa a falar, a música fez todo sentido, gerando um clima emotivo e especial, até para receber uma honraria, Hernán sabe o que pôr como tema. Cidadão de honra de Itajaí: ‘’em reconhecimento por sua significativa contribuição ao fortalecimento do cenário da música eletrônica de Itajaí, projetando a cidade internacionalmente.’’

O vídeo fala por si só, tudo foi perfeito, e acabou com o público puxando um coro de ‘’ole, ole, ole, Hernan Hernan’’. De fato, se havia uma cidade que deveria conceder esse título a ele, era Itajaí. Esse tipo de reconhecimento ajuda a solidificar a força expressiva da música eletrônica na sociedade, como um gênero como qualquer outro e que contribui o ano todo para o turismo local: beneficiando hotéis, pousadas, restaurantes e comércios em geral. 

Ver essa foto no Instagram

Uma publicação compartilhada por Thiago Morastoni (@thiagomorastoni)

Logo nas primeiras músicas o clima ‘’cattadance’’ se estabeleceu, com toda tensão anterior se dissipando e os sorrisos se abrindo por todos os lados. ‘’Savin’you (Antón Tumas Remix) de Nick Miur, um dos grandes clássicos do progressive house surgiu com seu vocal místico. 

Logo desci para a pista que já estava lotada, com todos querendo dominar o front para serem parte das linhas de grave. Olhando da pista, os lustres em cima do DJ estavam de volta, era algo que eu senti falta quando o clube reabriu. 

‘’Pinie’’ (feat Orbit, Sébastien Léger remix) de Parra for Cuva, dava o tom, aquele tipo de som das primeiras 2 horas de set, leve e dançante, muitos pianos e vocais femininos. ‘’Dripping Diamonds’’ de Guy Gerber & Albertina chamou atenção, fazia muitos anos que eu não ouvia Hernán tocar algo de GG.  A pista também estava bem mais escura, isso pode parecer algo simples, mas fez total diferença para o público entrar em estado de imersão. 

Mais uma faixa linda com ‘’Love You Better’’ de Quivver & Stelios Vassiloudis. Com todos embarcados, era hora de começar impor mais profundidade sonora. 

Isso vem com ‘’Passaporte Mundo’’ do paulista Luciano Scheffer por volta de 00h30, além de ‘’Via Fermi’’ de Gai Barone, criando aquele clima de tensão e envolvimento. 

Era quase 01h da manhã quando eu estava no camarote 1 com la banda de São Paulo e começo a ouvir a melodia ácida de ‘’Just Rain’’, lançamento de Guy J por sua nova gravadora. 

Audio Junkies em ‘’Aspects Of Rhythm’’ entra com um break que pôs todos com as mãos para cima! 

‘’The Night Mail’’ (Simon Vuarambon Remix) de New Jackson, deu uma nova dinâmica ao set. Saber a hora certa de acelerar, ao mesmo tempo que mantém a pista ‘’planchando’’ é sempre uma linha tênue. Eu penso que anos atrás isso era um debate maior, hoje em dia, as músicas estão um pouco mais padronizadas (não quero dizer iguais), no sentido de bons basslines e camadas de baterias, onde mesmo possuindo bpm’s mais lentos, são capazes de fazer todos dançar.

Maze 28 em ‘’Superbloom’’ é outra que vale mencionar, além de ‘’’Cloudbreaker’’ de Mike Rish, essa música me trouxe uma nostalgia enorme, lembrando-me da época de 2014, quando HC fez o set mais darkness que eu já ouvi, fazia tempo que não sentia esses timbres. 

Às 02h30 surge ‘’Alpha’’ do brasileiro Wilian Kraupp. Como é legal ver HC tocando música de qualidade de alguém local, de alguém que não seria produtor sem ter sido diretamente influenciado pela cena clubber de Santa Catarina. Foi como ver a história dando uma volta. 

Às 03h00 entra um dos momentos mais marcantes da noite! No meio do set, Catta joga ‘’Ether’’ de Rodrigo Lapena (Alan Cerra Remix), a faixa original por si só é incrível, porém, ele solta junto com o break uma capela replicando uma buzina de trem em efeito doppler, levando a pista ao delírio completo. Ser DJ é isso, não se trata de apenas passar músicas, mas sim de criar pequenas misturas que transformam seu set em algo único e marcante. Essa foi a música mais pedida no meu inbox do Instagram quando postei o vídeo, ficando conhecida como a ‘’bomba do trem!!’’. Que temazo! 

Essa música também estabelece um novo momento; agora é velocidade de cruzeiro, bandeiras da argentina e mãos para cima se confundindo. 

Depois de uma track assim, o que mandar? Fica difícil, porém, Hernan é expert em dobrar a aposta. E ele assim faz jogando ‘’Prodiga’’ de Simon Vuarambom. Que pedaço de obra prima! Quando ela vira do break, o sinth em notas menores se deteriora e simplesmente rasga a mente dos ouvintes. Já faz mais de 10 anos que Simon é um dos meus produtores favoritos e com essa música me parece que ele alcançou um novo patamar em suas produções. 

Às 03h30 chega outro grande momento, talvez o maior de todos! Hernan seleciona ‘’Hydra’’, novamente de Wilian Kraupp. Primeiro, que faixa linda, arpejos hipnóticos se sobrepondo em camadas bem delineadas e difíceis de esquecer. Segundo, ‘’la banda’’ de são Paulo vai para a pista e juntos, argentinos e brasileiros, puxam uma bandeira de vários metros no front. Metade sendo bandeira da Argentina, metade do Brasil e no meio uma foto de Hernan. Ele vira para mim e aponta ‘’olha isso’’.

Após sugerir a ideia, meu grande amigo Zé Benites foi atrás e o João Paulo produziu esse símbolo histórico que sempre será lembrado. E o melhor de tudo é que eles escolheram levantar bem na hora da música de um brasileiro. Sem combinar as coisas as vezes saem muito melhor do que o imaginado. 

Outro momento marcante vem logo depois com uma música que eu não identifiquei, mas que é aquele tipo de faixa obscura, mais rápida, meio tribal, com elementos levemente viajantes. É um clássico Catta jogar tracks assim das 3 as 5, aquelas 2 horas que eu amo e que sempre me fizeram pensar; ‘’como ele faz isso’’? Afinal, já havia tocado várias músicas incríveis, levantado o público algumas vezes. Porém, quando chega esse meio da noite é onde Hernan começa a abrir seus arquivos mais sombrios. 

A pista parece ficar ainda mais escura, aliás, poderia até se desligar as luzes, as pessoas dançam como se estivessem completamente entregues, sem gritos, sem mãos para cima, apenas vibrando de olhos fechados. 

É ali, nesse tipo de música, que ele definitivamente transforma admiradores em fãs devotos. Assista o vídeo abaixo e confirme você mesmo. 

No final do vídeo, meu amigo Cristiano sobe nas costas de alguém e levanta a bandeira da argentina escrito ‘’Resident’’. Esta bandeira eu havia ganho no front do Sunsetstrip Mendoza 2023 de um grande amigo chamado Hernan Mourad. Depois eu a dei de presente para o Cris e o JP, para colocarem no bunker de um club particular em Blumenau. Essa foto de Hernán apontando para ele viralizou, se tornando até a capa do grupo de fãs Resident no Facebook. 

Às 04h15 Wilian Kraupp marca seu hatrick com ‘’Phoenix’’, as luzes vermelhas se voltam em direção a cabine e sua melodia especial faz o resto do trabalho. 

04h40, de onde poderia vir mais faixas impactantes? Sempre há… ‘’Voyage’’ de Hernan e Hicky & Kalo com o remix de Cristoph. Sem dúvidas uma das melhores do ano e não poderia ficar de fora deste set. Nesse momento o Gustavo Conti aparece no palco e Hernan lhe abraça com carinho. Eles sabem que estava sendo especial e o sentimento de ‘’o templo está de volta’’ permeava o nosso entorno.

Às 05h o vocal sempre marcante de Dave Gahan do Depeche Mode ganha vez através de ‘’Its No Good’’ (ID edit). Eu posso dizer que já vi Hernan tocar dezenas de vezes ao longo desses últimos 15 anos, e não me recordo de uma única vez que ele não tocou algum edit da lendária banda de synthpop. Simplesmente porque a voz de Dave combina perfeitamente com música de pista e porque passa ano e entra ano produtores fazem novos edits da extensa discografia do grupo britânico. 

Logo em seguida vem uma sequência com ‘’Static Sky’’’ e sua melodia linda no break. Eu esperava que HC à tocaria mais no início, porém, um DJ desse nível pensa diferente, buscando entregar algo mais místico (como essa música) perto do amanhecer, apenas para dar uma acalmada na pista antes do sprint final. 

Às 05h20 surge ‘’Mama Loves You’’ de um dos meus DJs favoritos, Danny Howells à lançou recentemente pela Bedrock! 

Em meio a efervescência da noite, Hernan encontrava pequenos momentos para falar com seus amigos argentinos e brasileiros, ali atrás do dragão. Ele estava preocupado se todos estavam se divertindo e tendo um bom cuidado por parte do clube. Evidentemente estava feliz por voltar a um de seus 3 clubes favoritos no mundo e ver a pista lotada, enlouquecida e principalmente por perceber que a mágica do templo, famosa em todo mundo, continuava ali, recebendo a brisa entorpecente do mar da praia brava. 

‘’Experanto’’ de Petar Dundov (Pole Folder & Federico Epis Remix) foi outra faixa que impôs um clima mais mental e viajante. Continuando nessa tonalidade antes do amanhecer, às 05h45 joga ‘’ A Break In The Clouds’’ (Cid Inc. Remake) de James Holden. Uma de minhas músicas favoritas da vida, onde ele já havia tocado de manhã por volta de 2016 e agora à trouxe novamente para receber os aplausos do front por tanta qualidade. 

Já com um tom branco do lado de fora, era hora de voltar a acelerar, sem perder o clima mais viajante do horário. ‘’How to Wear Raybans Well’’, novo lançamento do Sasha caiu como uma luva, foi nesse momento que a bandeira voltou para pista para cobrir o pessoal e deixar sua marca mais uma vez. 

De forma inesperada, o tempo muda do lado de fora, raios solares surgem e invadem a pista coroando uma noite histórica. Qual a trilha do momento? ”Smaltalk” da banda Ultraísta (Antrim edit). O vocal da Laura Bettinson ecoando pelo club deixou todos vidrados e quando o beatbass voltou, todos ficaram incrédulos. Que track! 

‘’Back to the Future’’ de DCLVIII OFC, aquele tipo de faixa totalmente outsider, que encaixa bem de manhã e que provavelmente jamais iremos ouvir de novo. 

Jody Barr em ”Eleanor” vem para criar um sentimento anestésico, gerando em seguida um despertar coletivo. ‘’Já está acabando?’’. Não é possível, como pode ter sido tão rápido? Como pode um ser dotado do poder de propor música manipular o tempo a seu favor? 

Trazer uma pista que flutuou toda a noite de volta ao piso de madeira é algo que Cattaneo gosta de fazer, porém existem formas e formas de terminar um extended set. Com euforia ou mística, com energia ou tranquilidade. Tudo depende do que o DJ sentiu do público nas horas anteriores e de fato, todos já haviam dado tudo de si. 

The Do na faixa ‘’Dust It Off’’ (Kevin Di Serna & Santiago Teillagorry Edit) às 06h40 é mais um convite ao movimento corporal, seu vocal delicado soa como se você já soubesse a letra desde antes. Difícil esquecê-la. 

A missão ‘’return to origins’’ estava cumprida, se havia alguém capaz de fazer jus ao slogan da reconstrução do Warung, esse era Hernan. Muitos disseram que foi a verdadeira reinauguração e sem dúvidas foi a noite em que tudo estava mais próximo da perfeição. O soundSystem, a pista mais escura, a iluminação, o serviço prestado, os banheiros, tudo pareceu funcionar no padrão que estávamos acostumados por anos e anos do clube. 

Hernan finaliza com uma track cinematográfica, um vocal feminino e o sol dando o quadro perfeito no fundo – o sonho de qualquer fotógrafo.

Aplausos e seu nome em mantra. Que tal mais uma gota no oceano para nos emocionar outra vez? Sim, ‘’Medirian’’ de Henry Saiz & Guy J, um verdadeiro clássico produzido por dois gênios desse estilo que tanto amamos. Uma faixa que atravessa o tempo e que marcará qualquer geração que ouvi-la. Estávamos quase batendo às 07 da manhã e ainda coube um edit de ‘’Cornfield Chase’’, de Hans Zimmer, talvez o tema mais conhecido e aclamado de toda a história do cinema. Junto havia um mash-up com um vocal que não identifiquei. 

Essa 1 hora a mais pela manhã faz uma diferença tremenda na experiência do público, onde pode-se dançar um pouco mais com o dia claro; um dos motivos do club ser reconhecido e desejado por todos os DJs e clubbers do planeta. 

Há, e sobre o capítulo dedicado a Hernán neste livro imaginário, você poderia me perguntar; o que mais estaria escrito? Bem, ao ler relembraríamos das ‘’noites épicas de um argentino em um club de praia brasileiro’’. Provavelmente seria mencionado os lustres acesos iluminando levemente, os feixes de luzes vermelhas e azuis criando climas obscuros ou tensos de um lado, a vibração e emoção do público, do outro. Mas, principalmente, sua excelência e maestria inconfundíveis balançando em cima do palco. 

Abaixo tracklist com todas as faixas encontradas da noite até o momento do post deste review.

‘’Savin’you (Antón Tumas Remix) – Nick Miur

‘’Pinie (feat Orbit, Sébastien Léger remix) – Parra for Cuva

‘’Dripping Diamonds’’ – Guy Gerber & Albertina

‘’The Journey’’ – Ethan Tait & Boskasie

‘’Passaporte Mundo’’ – Luciano Scheffer

’Via Fermi’’ – Gai Barone

’Love You Better’’ – Quivver & Stelios Vassiloudis

‘’Alba’’ – Ezequiel Arias & Sebastian Sellares

‘’Big Time Sensuality’’- Björk (ID edit) 

‘’Dreaming Summer’’ – El Nikolas (Fer Torti Remix)

‘’Just Rain’’ – Guy J

‘’Cloudbreaker’’ – Mike Rish

‘’Is this Zazz’’ – Haen (André Moret remix)

 ‘’Mirage’’ – Kamilo Sanclemente, André Moret –

‘’Together’’ – Artche

‘’The Night Mail’’ (Simon Vuarambon Remix) – New Jackson

‘’Alpha’’ – Wilian Kraupp

‘’Ether’’-  Alan Cerra remix
‘’Prodiga’’ – Simon Vuarambon

‘’Hydra’’ – Wilian Kraupp

‘’Sirens’’ – Rebeskisounds (Tim Green remix)

‘’Drooping’’ – John Cosani

‘’Phoenix’’ – Wilian Kraupp

‘’Voyage’’ – Hernan e Hicky & Kalo (remix Cristoph)

Depeche Mode – ‘’Its No Good’’ (ID remix)

‘’Mama Loves You’’ – Danny Howells

Static Sky’’ – Hernan Cattaneo 

‘’Skin’’-  Kaz James

‘’Experanto’’- Petar Dundov (Pole Folder & Federico Epis Remix) 

‘’ A Break In The Clouds’’ (Cid Inc. Remake) – James Holden

How to Wear Raybas Well’’ – Sasha

”Smaltalk”- Ultraista (Antrim edit)

‘’Meridian’’ Guy J, Henry Saiz.

‘’First Step’’ – Hanz Zimmer

Tags: , ,