Fotos por: Adriel Douglas
Aconteceu. Finalmente Eric Prydz se apresentou em Santa Catarina. Um dos artistas mais aguardados de todos os tempos no estado passou pelo Green Valley no último dia 30 de março com um set de 3 horas dividindo opiniões, mas que para esse colunista, foi histórico, musicalmente falando e também devido a sua imensa contribuição para a formação do gosto e perfil dos clubbers da região.
Quando sua vinda foi anunciada, ocorreu um tipo de movimento nas redes sociais aqui do Sul um tanto raro de ser ver. Duas gerações comemorando, por motivos diferentes. Os mais novos, por poderem ver “o cara” das imagens em 3D, de Opus, do show HOLO, e da experiência imersiva dos seus diferentes alter egos.
Para uma geração mais velha, se tratava da chance de ver um verdadeiro herói das pistas. Um público na faixa dos 30 a 45 anos, que começou a sair nos anos 2000 e ouvia suas tracks nas pistas das dezenas de clubes do litoral norte e vale do Itajaí. Essa dicotomia iria causar sensações diferentes no público presente, que irei abordar adiante neste review.
A verdade era que ver Eric Prydz no Sul seria uma grande oportunidade, ver Eric fazendo um DJ set então? Se tratava de um grande privilégio. Porque? Simplesmente porque isso é algo muito raro. Quase todos apenas conhecem o ‘’show-man’’ e suas músicas lendárias fazendo todos vibrar através das imagens do show HOLO, que estava em tour aqui dois dias antes, mas e o DJ Eric Prydz? Deu-se uma oportunidade de ouro com um sábado de agenda disponível de um dos nomes mais disputados do planeta. A curadoria do Green Valley não hesitou e trouxe pela primeira vez Eric, Pryda, Cirez D, para tocar em um dos pólos mais intensos da cena eletrônica mundial.
Sem dúvidas essa cena (que já recebeu quase todos os big names que se tem notícia), merecia ter este nome riscado da lista. Consagração porquê? Simplesmente por ele ter se tornado um ídolo sem corresponder, por não fazer tours pelo mundo até poucos anos atrás. Se falava que ele não gostava de andar de avião, porém o fato é que agora anda. Imagine se o Guy J, ídolo de outra geração pós 2010, nunca tivesse vindo para o Brasil até hoje? Ou melhor, para a América do Sul toda… e que ele só viesse digamos em 2030… Então, esse foi o tanto de tempo que nós tivemos que esperar para ver Prydz ao vivo. Valeu a pena? Sim, a cada ano de aguardo. Vamos a festa!
Quando cheguei, estava tocando o warm-up oficial de Eric por todo mundo. Hoje, somente Cristopf tem o privilégio de abrir seus shows. Ele é um excelente produtor e um bom DJ, entrega o que lhe é pedido. Entretanto, para essa noite, eu considero que ele acelerou demais a pista, tocando um som para meio da noite. O público gostou claro. Sua culpa é não saber o estilo que Eric iria jogar depois? Não posso dizer como é a comunicação entre eles, mas, penso que se você é contratado para ser o DJ oficial de abertura, deve estar sempre munido de qualquer desvio de rota do headliner. O warm dele foi para o show HOLO, porém, Eric não fez o set do seu show.
Às 02h em ponto, a lenda surge tranquilamente e assume a pista zerando tudo, através de uma abertura linda com “Beyond 8’’, dando um claro sinal do que ele pretendia fazer nessa oportunidade.
O que aconteceu em seguida foi uma das construções mais belas que eu ouvi nos últimos anos! Faixas como “Vega’’, “Craft’’, ‘’Level 99’’, “Remember’’, “Frankfurt’’, fizeram a primeira 1h30 de set ser algo sublime.
Estava flagrante a felicidade dele enquanto tocava, sem pressão, sem precisar fazer um set totalmente sequenciado com imagens. Ainda que fosse uma construção muito, muito meticulosa, pensada para ir ganhando peso, como deve ser, a progressão foi sem pressa.
Eu estava colado no front, vendo sua enorme concentração e estava tudo certo, enquanto eu observava todos dançando e curtindo, só ficava pensando que muitos nem tinham ideia da aula de progressive house que ele estava dando para nós. Sim, Eric tem em sua essência este estilo que é tão ligado a Santa Catarina, e vou além, ele é um dos maiores produtores desse gênero em todos os tempos.
Dezenas de produtores beberam de seu gênio criativo. O mais incrível é ver como suas tracks soam muito atuais e modernas em seus arranjos e elementos. Claro que, com aquela linha de baixo de um groove rasgando o Cutoff, que hoje não se faz tanto, mas que eu acho incrível.
Sua discografia é tão rica e singular, que com faixas lado B, ele pode construir um set que certamente entrou para o hall dos grandes já feitos na história da Green Valley.
No meio do set, ele joga o vocal em acapella “Love Sensation’’ de Loleatta Holloway, uma voz forte, negra e feminina estilo Blues de 1980. As cores dos telões ficaram vermelhas e uma vibe épica se criou ao nosso redor. Que momento!
No final da segunda hora, ele começou a por faixas mais rápidas e mais emotivas, indo mais a um tom transcendental. Destaques para ‘’Everyday’’, “Javiar’’, ‘’Armed’’ e ‘’Clapham’’.
Quando eu jamais esperaria, ele solta um lindo remix da clássica ‘’Forget the World’’ do John Creamer & Stephan K. (que completa 20 anos esse ano). Ela começa com BPM bem baixo e vai subindo, até o ritmo do BPM do set. Eu acho esse tipo de ‘’quebra’’ algo corajoso e difícil de se fazer.
Depois disso ele começou a trazer o lado Cirez D para o jogo, ou seja, mais techno para a pista. Eu adoro um set que começa progressivo e sobe até o techno com coerência. Entendo a importância de acelerar a pista e dar mais pressão. Faixas como “The Frequency’’, ‘’The Eve’’ e ‘’Parklife’’ entraram em ação.
Anyma & Chris Avantgarde ‘’Consciousness’’, um hino do melodic e que faz parte do show HOLO, surge para ser o primeiro agrado aos fãs mais novos em todo o set.
Para entrar na fase final, vem a faixa “Sol’’, além de “We Are Indicators’’ do Indicatorns, “Phantom Paris’’ e outra surpresa linda com “One More Time’’ do Daft Punk. Fazendo todos cantarem juntos e rolar uma pequena comoção por ouvir essa faixa ao vivo.
“The Return’’, com a clássica imagem de uma galáxia (do show HOLO) surge para ser um dos destaques do set, sendo também um agrado aos fãs que esperavam o lado mais comercial de Eric.
Quando chega 05h am, ele encerra com aplausos e ao meu redor ouço gritos por “Opus”, e claro, ele já a tinha preparada para dar o play.
É sem dúvidas uma das maiores obras de sua carreira e da história da Dance Music. Também a faixa que o faz explodir (de novo) globalmente entre um público que nem chegou a conhecer sua fantástica discografia dos anos 2000.
No dia seguinte, me deparo com comentários no instagram do clube reclamando sobre ele não ter tocado “as mais famosas’’, ou que “não surpreendeu’’ ou “não era o que esperava’’. Eu simplesmente não conseguia acreditar no que estava lendo. O perfil das pessoas que estavam reclamando? Abaixo dos 30, o que explica, era a geração de Opus (que ele tocou) reclamando por ele não ter tocado mais faixas do show HOLO (tocou, como mencionei antes).
A Green Valley quando promoveu sua vinda, que era um grande sonho dos proprietários também, tratou de explorar comercialmente tudo que poderia para garantir uma noite de casa cheia, e isso ocorreu. Eu compreendo, porém eles contrataram o DJ e não o show HOLO, algo que pode ter confundido as coisas. O DJ é livre para tocar o que quiser, dentro de seu estilo, claro.
Até se ele quisesse tocar somente faixas de outros produtores (deve ter tocado umas 2 ou 3 no máximo), seria válido, desde que fosse no seu estilo. Pois no fundo, é o estilo, a mensagem sonora que importa. Eu acredito que ele adorou poder explorar outras faixas mais antigas incríveis que possui e que até acho que é sua verdadeira essência. Não é no techno, não é no eletro ou no melodic, é sim no progressive house que mora o coração desse verdadeiro ícone.
Para um fã desse estilo como eu, foi um deleite. Entendo a frustração de quem esperava a playlist de HOLO, porém lamento não conseguirem compreender o grande set que ele trouxe para Santa Catarina.
Eric mostrou que para além de um gênio artístico, criativo e a frente do tempo, é também um grande DJ. Suas mixagens no compasso com loops se entrelaçando entre as músicas, tudo muito bem calibrado e de uma maestria impressionante. Eu já havia notado que ele era um ótimo DJ no show HOLO de 2023, que foi histórico diga-se passagem, o fazendo querer voltar logo para o Brasil já esse ano.
De qualquer forma, acredito que a grande maioria gostou do seu set, e que a reclamação de alguns não se faz maior do que comentários de internet. Eric merece respeito, pois muito da cena clubber que temos aqui hoje, passa por suas músicas e aguardo muito seu retorno.
Playlist completa da noite abaixo
Tracklist da noite com boa parte das músicas tocadas, aqui.
It’s all about groove