Do outro lado do mundo conheça o duo indiano Audio Units

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Por em 21 de março, 2019 - 21/03/2019

 

No cenário underground, a Índia ainda é um país que não possui um leque muito grande de DJs renomados, mas com certeza existem personagens executando um ótimo trabalho que, aos poucos, estão ganhando a notabilidade merecida. Foi no sul do país asiático, mais precisamente em Bangalore, que a Nin92wo [importante gravadora de techno do cenário nacional] encontrou o Audio Units, um projeto de música eletrônica formado por dois irmãos, Ashwin e Ashrith Babu Rao. Pela gravadora, o duo fez sua estreia com um remix para música que dá nome ao EP, They Came From the Skies, original de outro produtor Indiano, Seventh Sea.

 

 

Fascinados pela universo musical desde criança, os dois já faziam música juntos desde o início dos anos 90, mas se lançaram ao mercado efetivamente no ano de 2011, quando disponibilizaram seu primeiro release de progressive house no Beatport. Ao decorrer da carreira, os estilos explorados pela dupla sempre foram os mais variados, com uma habilidade notável de transformar qualquer tipo de som em profundas melodias, garantindo-lhes um perfil sonoro experimental e inovador com atmosferas hipnóticas. Curiosos para saber mais sobre o cenário eletrônico na Índia e o intercâmbio com o mercado brasileiro, conseguimos bater um papo bem interessante com a dupla que, apesar de longa, ficou extremamente rica e com comentários incríveis. Leia abaixo:

 

 

Olá, Audio Units! Obrigado por falar conosco. Vocês já receberam suporte de artistas de grande porte, como Nick Warren, Andhim, Satoshi Tomiie, Mark Knight e até mesmo da brasileira Joyce Muniz. Qual é o sentimento em ter o trabalho reconhecido por esses DJs?

 

Audio Units: Todo artista pode se identificar com essa situação. Quando você começa uma faixa, parece ótima e quando você passa dias/semanas ajustando ela, seus ouvidos começam a fracassar e ela fica desinteressante. Então, a data de lançamento se aproxima, e você irá lançar de qualquer forma, certo? Neste momento, você está oscilando entre um estado de distopia e narcisismo. Você até diz a si mesmo “merda, eu deveria ter mudado um pouco isso, talvez consertar isso, porque uma obra de arte nunca está realmente ‘acabada’”. Mas aí você recebe um pequeno e-mail, uma mensagem no Facebook, um vídeo de um amigo e aí está ela, a sua faixa tocando!

 

O sentimento é absolutamente extasiante, faz você querer voltar para o estúdio e escrever mais músicas, principalmente se vier de um artista que você admira. É o mesmo sentimento quando vem de alguém que você não conhece, apenas o sentimento de sua música fazer parte do gosto de outra pessoa, reafirma a fé no que você faz, mas não nos entenda mal, não é como buscar por validação, sempre fazemos a música que queremos, independente do suporte.

 

Então, Joyce tocou uma de nossas faixas “Chicago Shuffle”, há aproximadamente 2 ou 3 semanas, em um Radioshow, Nick Warren tocou “Multani” em seu podcast, mas o melhor sentimento foi quando um amigo nosso nos enviou um vídeo de Citizen Kain tocando “Hindol” em uma festa, pois se não fosse por esse cara fazendo o vídeo, nunca saberíamos.

 

 

A Ásia possui uma cena eletrônica que vem crescendo significativamente, mas ainda não possui um cultura tão aberta como em outros continentes. Como vocês enxergam a cena na Índia ou até mesmo no próprio continente asiático nos próximos 5 anos?

 

Bom, para ser sincero, ela se abriu de formas que nunca imaginávamos na Índia, não é sobre a cultura que falamos, tem mais a ver com leis arcaicas e políticos que impedem a cena de progredir. Acabamos de voltar de um festival fantástico, que aconteceu em um castelo do século 18, com música quase sem parar por 3 dias. Temos festas secretas, raves estilo warehouse, pessoas com espaços privados que oferecem noites ótimas para suas comunidades em todo o país, então, se é isso que está acontecendo agora, temos grandes esperanças para os próximos 5 anos. Haverá mais bookings, novos locais e o mais importante de tudo, um número ainda maior de artistas de qualidade.

 

Percebo que vocês são artistas que estão constantemente buscando deixar o som com uma roupagem atual e inovando nas produções. Quais as estratégias utilizadas para ter mais criatividade dentro do estúdio e qual setup tem mais ajudado vocês?

 

De alguma forma, nunca estamos contentes com o que fazemos, toda vez que terminamos algo, aprendemos algumas coisas que queremos aplicar e tentar na próxima vez ao invés de uma abordagem estereotipada. A coisa mais importante para nós dois é que o processo seja divertido, precisamos entrar no que estamos fazendo e aproveitar. Nosso setup nos últimos 8 anos tem sido Ableton Live, Ashrit também é um Ableton Certified Trainer, então ele sempre tem novos truques na manga, acesso aos novos plugins, etc,. Aprendemos muito com o ensino que fazemos no Beatworx, às vezes até escutamos um trabalho muito inspirador de alguns de nossos alunos. Todos esses fatores contribuem para o processo criativo.

 

Tecnicamente falando, tivemos muitos sintetizadores analógicos que apreciamos e, mais recentemente, temos o Eurorack com alguns módulos e estamos tocando essas máquinas. Quando tocamos, também temos um set híbrido que envolve o uso do Ableton Push 2 para improvisar nas faixas existentes com novos ritmos e melodias, às vezes isso ajuda muito em nossa mesa de produção no aspecto de entender o que funciona e não funciona na pista. Mas, independentemente das técnicas que evoluem com o tempo, a coisa mais importante a se desenvolver constantemente é o nosso gosto.

 

Sabemos que a relação entre irmãos varia muito de família para família [risos]. No caso de vocês, crescer lado a lado ajuda atualmente na hora da produção? Vocês tem referências artísticas diferentes ou são mais parecidas?

 

Nós dois crescemos com muito amor por tecnologia, vídeo games e outras coisas nerds. Embora nossas evoluções musicais tenham caminhos diferentes [já que temos 8 anos de diferença um para o outro], sempre encontramos um ponto em comum. Quatro ouvidos são melhores do que dois, às vezes, assim como todos nós enxergamos as cores de forma diferente, também ouvimos e prestamos atenção em diversas coisas.

 

Para responder de forma mais direta, com certeza, a diferença de idade que nós temos desempenha um grande papel. Acho que isso também pode ser uma força, ficar preso no passado pode ser ruim. O que acho que funciona para nós é o fato de que Ashwin conhece todos os clássicos e percorreu por todos os espectros de sons, já Ashrith não se importa muito com eles e traz algo novo para a mesa. Embora os primeiros anos terem sido difíceis, foi o cruzamento dos nossos gostos individuais que nos levou a experimentar, tentar fazer de tudo, do pop brega ao trance psicodélico. Então, sim, todos esses estilos e diferenças foram o que moldaram o que nós somos hoje.

 

Hindol é a faixa que tem feito mais sucesso até agora, certo? Gostaríamos de saber como foi o processo criativo dessa música e quão importante foi a Parquet Recordings nesse lançamento?

 

Então, em 2016, decidimos ficar um tempo sem lançar música e, em vez disso, tentar trabalhar em uma hora de músicas que poderiam ser tocadas em nossos sets, passamos um ano e meio fazendo isso. Foi estranho estar nessa posição, pois como artista, às vezes, você é pressionado internamente a lançar algo para ser relevante, conseguir gigs, etc,. Você também tem uma competição saudável com seus colegas, que estão produzindo música boa, e quando você está um pouco quieto, todos perguntam “o que está acontecendo?”, certo? Ficou difícil depois de um tempo, quando tínhamos muitas músicas acabadas e não tínhamos certeza se eram boas ou ruins, pois todo o processo era diferente do que havíamos tentado antes.

 

Uma parte da inspiração também veio de todo o som de techno melódico da América do Sul, artistas como Binaryh e Blancah. Queríamos escrever uma faixa que pudesse tocar com algumas dessas faixas em nossos sets, e nos propusemos a dar um humor essencialmente étnico e indiano, mas, ao mesmo tempo, moderno. Após inúmeras tentativas de sintetizadores, tons graves, melodias, nós achamos os elementos certos e os reunimos com o que queríamos que fosse a segunda faixa do EP. Começamos a enviar demos para algumas gravadoras que adoramos, não recebemos respostas por aproximadamente um mês, e quando pensamos que deveríamos descobrir o que tinha de errado, Solee respondeu o e-mail dizendo que queria assinar “Hindol” na Parquet Recordings, em uma compilação. Ficamos emocionados e saiu.

 

https://www.youtube.com/watch?v=lcN0282cDbU

 

Quem acompanha vocês sabe que uma das metas do Audio Units é começar a fazer live sets. Poderiam nos contar como está a evolução desta ideia e o por quê dessa vontade?

 

Todo o aspecto de ver alguém criar algo na sua frente é tão instigante quanto o pensamento sobre os limites das imperfeições. Quando você senta em um estúdio e escuta uma faixa, você pode notar alguns pequenos detalhes que não encaixam tão bem, mas se você vê alguém criar na sua frente, você está mais envolvido no processo de criação do que no resultado final, e isso muda tudo, certo?

 

Gostaríamos de começar primeiro fazendo um set original esse ano, para que possamos testar muitas faixas inéditas e eliminar as ruins para então colocar essas faixas boas em um live set improvisado com nossa Eurorack, Drum Machines e Synths. Acho que estamos mais perto do que nunca. Fiquem atentos para isso!

 

Para finalizar, o que vocês sabem sobre o mercado brasileiro de música eletrônica? Tocar aqui pode ser considerado um sonho? Obrigado!

 

Vocês não têm uma festa insana acontecendo o tempo inteiro? Na rua, nas praias, nos clubes loucos? Ouvimos somente coisas boas sobre a cena do Brasil, mas também estamos quase certos de que há conflitos de lei e autoridades. Este club, chamado D-EDGE, acho que faz algumas festas incríveis. A música eletrônica brasileira é incrível, desde o psy trance ao techno, há essa peculiaridade em seus sons, a qual gostamos muito. Tocar no Brasil seria um sonho dentro de um sonho!

Obrigado!

 

Por: Marllon Gauche

 

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